Hemofilia

Hemofilia
Hemofilia
Um casal com um homem saudável e uma mulher portadora podem ter uma criança do sexo masculino sadia e uma hemofílico, ou uma criança do sexo feminino sadia e outra portadora.
Especialidade Hematologia
Sintomas Hemorragias inesperadas ou frequentes[1]
Início habitual À nascença[2]
Causas Geralmente genéticas[3]
Método de diagnóstico Análises ao sangue[4]
Prevenção Rastreio embrionário[4]
Tratamento Reposição dos fatores de coagulação em falta[3]
Frequência 1 em 7500 homens (hemofilia A), 1 em 40 000 homens (hemofilia B)[2][5]
Classificação e recursos externos
CID-10 D66-D68
CID-9 286
OMIM 306700, 306900, 264900
DiseasesDB 5555, 5561, 29376
MedlinePlus 000537
eMedicine med/3528
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Hemofilia é uma doença genética essencialmente hereditária que compromete a capacidade do corpo em formar coágulos sanguíneos, um processo necessário para parar as hemorragias.[2][3] A condição leva a que as pessoas sangrem facilmente ou com frequência mesmo após pequenas lesões, a que se formem facilmente contusões e a que aumente o risco de hemorragias nas articulações ou no cérebro.[1] As pessoas com formas mais ligeiras da doença podem manifestar sintomas apenas na sequência de um acidente ou durante cirurgias.[1] As hemorragias nas articulações podem resultar em lesões permanentes e hemorragias cerebrais podem resultar em cefaleias crónicas, ataques apopléticos ou diminuição do nível de consciência.[1]

Existem dois tipos principais de hemofilia: hemofilia A, causada por deficiência de fator de coagulação VIII, e hemofilia B, causada por deficiência de fator de coagulação IX.[2] Estes dois tipos são geralmente herdados de um dos progenitores por via de um cromossoma X com um gene não funcional.[6] Em casos raros, pode também ser adquirida, sendo causada por uma mutação genética durante as fases iniciais do desenvolvimento ou adquirida em idade adulta devido à formação de anticorpos que atacam os fatores de coagulação.[2][6] Entre outros tipos menos comuns estão a hemofilia C, causada por deficiência de fator XI, e a deficiência em fator V.[7][8] A hemofilia adquirida está associada a cancros, doenças autoimunes e à gravidez.[9][10] O diagnóstico da condição é feito mediante análises ao sangue, em que é avaliada a capacidade de coagulação e a quantidade de fatores de coagulação.[4]

No contexto de fertilização in vitro, a prevenção pode ser realizada removendo um óvulo, fecundando-o e examinando o embrião antes de ser transferido para o útero.[4] O tratamento consiste na reposição dos fatores de coagulação em falta.[3] A reposição pode ser realizada a intervalos regulares ou durante episódios de hemorragias,[3] e tanto pode ser feita em casa como no hospital.[11] Os fatores de coagulação podem ser produzidos a partir de sangue humano ou produzidos ou através da produção de proteínas recombinantes.[11] Até 20% das pessoas com hemofilia desenvolvem anticorpos que atacam os fatores de coagulação, o que dificulta o tratamento.[3] Em pessoas com hemofilia A ligeira pode ser administrada desmopressina.[11] Estão atualmente a decorrer os primeiros ensaios clínicos em seres humanos para terapia genética.[12]

A hemofilia A afeta cerca de 1 em cada 5000-10 000 homens e a hemofilia B cerca de 1 em cada 40 000 homens à nascença.[2][5] Uma vez que as hemofilias A e B são doenças recessivas ligadas ao X, raramente afetam de forma significativa as mulheres.[6] No entanto, algumas mulheres com um gene não funcional num dos cromossomas X podem apresentam sintomas ligeiros.[6] A hemofilia C ocorre de forma igual entre ambos os sexos e a maioria dos casos ocorre entre os Asquenazes.[5] No século XIX, a hemofilia era uma condição comum entre as famílias reais europeias.[5] A distinção entre hemofilia A e B foi estabelecida em 1952.[5] O termo tem origem no grego αἷμα (haima, sangue) e φιλία (filia, afeição).[13]

Sinais e sintomas

Os sintomas característicos variam de acordo com a gravidade. Em geral os sintomas são episódios de sangramento interno ou externo.[14] Pacientes com hemofilia mais grave sofrem sangramentos mais graves e mais frequentes, enquanto os pacientes com hemofilia leve geralmente sofrem os sintomas mais leves, exceto após a cirurgia ou trauma grave. Hemofílicos moderados têm sintomas variáveis ​​que se manifestam ao longo de um espectro entre formas graves e leves.

Em ambas hemofilias A e B, ocorre sangramento espontâneo, mas um tempo de sangramento normal, tempo de protrombina normal, o tempo normal de trombina, mas prolonga o tempo de tromboplastina parcial. Hemorragia interna é comum em pessoas com hemofilia A grave e algumas pessoas com hemofilia moderada. O tipo mais característico de hemorragia interna é um sangramento articular onde o sangue entra nos espaços articulares.[15] Isso é mais comum com os hemofílicos graves e podem ocorrer espontaneamente (sem trauma evidente). Se não for tratada rapidamente, hemorragias nas articulações podem levar a lesões articulares permanentes e desfiguração.[15] Sangramento em tecidos moles, como músculos e tecidos subcutâneos é menos grave, mas pode levar danos e requer tratamento.

Diagnóstico

  • Dosagens dos respectivos fatores de coagulação.
  • No caso de deficiência do fator VIII deve-se procurar diferenciar a doença da doença de von Willebrand. Na doença de von Willebrand pode ocorrer também uma diminuição do fator VIII.

Tratamento

Não há cura para a hemofilia,mas existem vários estudos que procuram a melhora do tratamento. Controla-se a doença com injeções regulares dos fatores de coagulação deficientes. Alguns hemofílicos desenvolvem anticorpos (chamadas de inibidores) contra os fatores que lhe são dados através do tratamento.

  • Severa: o paciente deve receber produtor do plasma para evitar ou controlar episódios de sangramento durante toda sua vida. O nível dos fatores tem que ser elevado pra +/- 30%

Preparações terapêuticas pro fator VIII: CRIOPRECIPITADO e concentrado liofilizado de fator VIII comerciais.

O concentrado de fator IX existe sob a forma de proteína isolada (Concentrado de Fator IX liofilizado) ou sob a forma de "complexo de protrombina concentrado" liofilizado que é uma mistura contendo os fatores (II, V, VII e IX) que se apresenta também sob forma de liófilo.

  • Leve: terapêutica de reposição apenas depois de um trauma ou para evitar sangramento pós-operatório.

Mais recentemente apareceram os concentrados comerciais de Fator VIII e IX advindos da engenharia genética, esses produtos não são obtidos a partir da purificação do plasma humano, mas sim da manipulação de organismos transgênicos que carregam o gene que expressa as referidas proteínas.

História

O Talmude e os rabinos subsequentes conheciam a hemofilia, e sabiam que a transmissão hereditária se dava através da mãe, que não sofria da doença.[16] Segundo o Talmude uma criança não deveria ser circuncidada se já tivessem morrido dois irmãos em tal procedimento, ou mesmo se houvessem morrido dois primos, filhos de irmãs:[17]

Porque foi ensinado: se ela circuncidou o primeiro filho, e ele morreu, e um segundo filho também morreu, ela não deve circuncidar o terceiro filho. (...) Aconteceu uma vez com quatro irmãs de Séforis, que a primeira circuncidou seu filho, e ele morreu, em seguida a segunda circuncidou e ele também morreu, e quando a terceira circuncidou, ele também morreu. A quarta foi ao Rabino Simeon ben Gamaliel, e ele disse que ela não deveria circuncidar seu filho, mas é possível que ele teria dito a mesma coisa para a terceira irmã.

No século XII, o médico árabe Abulcasis descreveu um caso de uma família cujos homens haviam morrido de sangramento após pequenos ferimentos. Em 1803, o médico norte-americano John Conrad constatou que havia "tendências a sangramentos em algumas famílias." Ele chegou a conclusão que a doença era hereditária e acometia mais homens do que mulheres.

O termo hemofilia apareceu pela primeira vez em 1828 por Hopff da Universidade de Zurique. Em 1937, Patek e Taylor, dois médicos de Harvard descobriram a globulina anti-hemofílica. Pavlosky, um médico de Buenos Aires, separou a Hemofilia A e Hemofilia B laboratorialmente. Este teste era feito transferindo o sangue de um hemofílico para outro hemofílico. O fato corrigia o sangramento, comprovando que havia mais de um tipo de hemofilia.

A hemofilia é, muitas vezes, associada à história da Monarquia na Europa. A rainha Vitória passou a doença ao seu filho Leopoldo,[18] e através de várias das suas filhas, a várias famílias reais Europeias, incluindo as famílias reais da Espanha, Alemanha, e Rússia. Alexei Romanov, filho do Czar Nicolau II da Rússia, foi um dos descendentes da Rainha Vitória que herdou a doença.

Durante as décadas de 1970 e 1980 a falta de outras modalidades de tratamento e a insuficiência de tecnologia para diagnosticar alguns vírus como o da AIDS acarretou em contaminação em grande escala da população hemofílica que dependiam de constantes transfusões de sangue. Mas este é um cenário que não está totalmente no passado, a maioria absoluta, em torno de 75%, da população mundial de hemofílicos não dispõe dos medicamentos básicos para o tratamento desta patologia, ficando ainda, estes, sujeitos às transfusões de sangue que pode lhes salvar a vida como também pode tirá-la.

A rainha Vitória passou a hemofilia para muitos dos seus descendentes.
Alexei Nikolaevich Romanov (1904-1918), filho de Nicolau II, último imperador da Rússia, era hemofílico.

O dia 17 de abril é considerado o Dia do Hemofílico.[19]

Ver também

Referências

  1. a b c d «What Are the Signs and Symptoms of Hemophilia?». NHLBI. 13 de julho de 2013. Consultado em 8 de setembro de 2016. Cópia arquivada em 17 de setembro de 2016 
  2. a b c d e f «What Is Hemophilia?». NHLBI. 13 de julho de 2013. Consultado em 8 de setembro de 2016. Cópia arquivada em 4 de outubro de 2016 
  3. a b c d e f «Hemophilia Facts». CDC. 26 de agosto de 2014. Consultado em 8 de setembro de 2016. Cópia arquivada em 27 de agosto de 2016 
  4. a b c d «How Is Hemophilia Diagnosed?». NHLBI. 13 de julho de 2013. Consultado em 10 de setembro de 2016. Cópia arquivada em 15 de setembro de 2016 
  5. a b c d e Wynbrandt, James; Ludman, Mark D. (1 de janeiro de 2009). The Encyclopedia of Genetic Disorders and Birth Defects. [S.l.]: Infobase Publishing. 194 páginas. ISBN 978-1-4381-2095-9. Consultado em 25 de agosto de 2013. Cópia arquivada em 8 de janeiro de 2014 
  6. a b c d «What Causes Hemophilia?». NHLBI. 13 de julho de 2013. Consultado em 10 de setembro de 2016. Cópia arquivada em 8 de setembro de 2016 
  7. Franchini, M; Mannucci, PM (outubro de 2011). «Inhibitors of propagation of coagulation (factors VIII, IX and XI): a review of current therapeutic practice.». British Journal of Clinical Pharmacology. 72 (4): 553–62. PMC 3195733Acessível livremente. PMID 21204915. doi:10.1111/j.1365-2125.2010.03899.x 
  8. Thalji, N; Camire, RM (setembro de 2013). «Parahemophilia: new insights into factor v deficiency.». Seminars in thrombosis and hemostasis. 39 (6): 607–12. PMID 23893775. doi:10.1055/s-0033-1349224 
  9. Franchini, M; Mannucci, PM (dezembro de 2013). «Acquired haemophilia A: a 2013 update.». Thrombosis and Haemostasis. 110 (6): 1114–20. PMID 24008306. doi:10.1160/TH13-05-0363 
  10. Mulliez, SM; Vantilborgh, A; Devreese, KM (junho de 2014). «Acquired hemophilia: a case report and review of the literature.». International journal of laboratory hematology. 36 (3): 398–407. PMID 24750687. doi:10.1111/ijlh.12210 
  11. a b c «How Is Hemophilia Treated?». NHLBI. 13 de julho de 2013. Consultado em 10 de setembro de 2016. Cópia arquivada em 17 de setembro de 2016 
  12. Peyvandi, F; Garagiola, I; Young, G (9 de julho de 2016). «The past and future of haemophilia: diagnosis, treatments, and its complications.». Lancet. 388 (10040): 187–97. PMID 26897598. doi:10.1016/s0140-6736(15)01123-x 
  13. Douglas Harper. «Online Etymology Dictionary». Consultado em 10 de outubro de 2007. Cópia arquivada em 6 de março de 2008 
  14. «Types of Bleeds» (em inglês). National Hemophilia Federation. Consultado em 17 de dezembro de 2013 
  15. a b Dimitrios P Agaliotis, MD, PhD, FACP, Robert A Zaiden, MD; Saduman Ozturk, PA-C. «Hemophilia Overview» (em inglês). eMedicine from webMD. Consultado em 17 de dezembro de 2013  A referência emprega parâmetros obsoletos |coautores= (ajuda) !CS1 manut: Nomes múltiplos: lista de autores (link)
  16. Yebamot 64b, citado por Fred Rosner, em Jewish Virtual Library, Judaism, Genetic Screening and Genetic Therapy, Genetics and Eugenics in Classic Jewish Sources [em linha]
  17. Yebamoth 64 [em linha]
  18. Simõnes de Paula, E. Revista de história, Edição 21; Edições 43-44. Departamento de História, Sociedade de Estudos Históricos, 1960. pp. 496-497.
  19. Castro Sá Lima, Mariana Araguaia de. «Hemofilia». Terra. Mundo Educação. Consultado em 17 de dezembro de 2013 

Ligações externas

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  • Hemofilia no Manual Merck
  • Centro Internacional de Treinamento em Hemofilia
  • Associação dos Hemofílicos do Rio de Janeiro
  • Centro dos Hemofílicos do Estado de São Paulo
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